Demarcação de terras indígenas pode estar ameaçada em MS

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Atualmente o Brasil contabiliza mais de 230 processos de demarcação de terras indígenas de diferentes etnias. São 238 no total. MS (Mato Grosso do Sul), de acordo com uma reportagem do Campo Grande News divulgada ontem (15/1), é o 2º maior com territórios em processo de demarcação.

Os dados são da Funai (Fundação Nacional do Índio).

A reportagem do site destaca que com a mudança da responsabilidade das demarcações feitas até então pela Funai, mas que agora passará para o Ministério da Agricultura, é uma ameaça aos processos.

Essa mudança foi realizada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), e que durante uma visita em Dourados, em 2018, chegou a afirmar “que não haverá mais 1 cm de terra para índios” e, recentemente, disse que todos as terras homologadas nos últimos dez anos seriam revistas.

No Estado são 16 territórios em estudo, qautro delimitados e nove declaradas, o último processo antes da homologação. Dos nove declarados, reivindicam demarcação quatro etnias: Terena, Guarani Kaiowá, Ofayé-Xavante e Guarani Nhandeva.

Comunidade internacional

De acordo com o Campo Grande News, uma das terras declaradas é a dos Terenas, Cachoeirinha, em Miranda. São 36.288 hectares declarados, mas os indígenas, pouco mais de 7 mil, ocupam uma reserva de 2688 hectares. Uma das lideranças locais, Lindomar Terena, afirma que a comunidade já recorreu até a Justiça para a conclusão do processo.

“Atualmente não há nenhum impedimento judicial, tanto é que a Justiça está determinando que seja feito uma perícia na fazenda Capão Verde, e no final de tudo acaba se comprovando que é terra indígena. A gente ingressou na Justiça para que a Funai seja obrigada a colocar os marcos físicos, esse processo está correndo na Justiça, mas não temos decisão”, comenta.

Com a falta de espaço e demora na demarcação, a terra sofre um processo de êxodo rural. Muitos moradores da Cachoeirinha vivem, hoje, em Campo Grande, nas aldeias urbanas.

“Ocorre por terem pouca terra, a reserva é uma área de 2688 hectares, para uma população de 7 mil, o povo Terena sempre viveu da agricultura, se não tem espaço obriga a deixar a aldeia”, opina.

Agora, explica o Terena, resta recorrer aos “mecanismos internacionais” caso os direitos indígenas não sejam respeitados.

“A gente fica na verdade sem saber para que lado a Justiça funciona, só cobramos que seja implementado a lei. Não tem uma política de estado para dar continuidade. Agora, a gente tem ouvido muito que o governo quer revisar várias terras demarcadas, homologadas, registradas nos últimos 10 anos, com certeza nós vamos acionar os mecanismos internacionais”, relata.

Uma espera de mais de 20 anos

Há mais de 20 anos a terra indígena dos Ofayé-Xavante espera pela demarcação do território de 1.937,6250 declarado, para abrigar cerca de 100 pessoas da etnia, além de indígenas Guarani e Kaiowá que também vivem na aldeia Anodi, em Brasilândia, a 355 km de Campo Grande.

Antropólogo responsável pelos estudos que identificaram o território, Carlos Alberto dos Santos Dutra explica que o processo começou em 1992.

“Tinha uma ação na Justiça e agora que saiu o resultado, então o processo está aberto, pronto para ser assumido. Hoje a aldeia possui 110 pessoas morando, divididos em três etnias, os Ofayé foram agregando outras tribos, chegou muitos Guarani e Kaiowá, está nascendo uma nova cultura”, comenta.

Enquanto aguardam a demarcação final, a cultura vai mudando, agregando novas características. Segundo o antropólogo, há cerca de 35 pessoas da etnia Ofayé no local. “A cultura é transmitida pela mãe, há grande quantidade de mulheres Kaiowá casando com homens Ofayé”, explica ele, sobre as mudanças na transmissão da língua e costumes.

“Os estudos indicam que em 1700 e pouco já tinha presença dos Ofayé na margem direita do Rio Paraná. Eles perambulavam, mas foram expulsos a partir dos anos 1970, foram para Bodoquena e voltaram em 1980”, contou.

Professor, o Ofayé Silvano de Morais de Souza espera que, pela data do processo de demarcação, a terra fique de fora “da revisão do governo”, ainda assim, comenta ele, sobra preocupação.

“A nossa já tem 27 anos de luta judicial, eu não sei se nós entraríamos diretamente ou indiretamente. Acho que todo indígena teme em relação às terras indígenas. Os Ofayé, aqueles que lutam pela posse, ter a sua produção… a terra para nós, além de um ato importante, também faz parte da nossa história. Todo índio que tem uma ligação com a terra teme essa ideologia, não sei qual os meios tomados por ele. A gente está preocupado”, declar