PCC queria executar dois agentes federais em Campo Grande

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A descoberta de planos do Primeiro Comando da Capital, facção criminosa que controla o tráfico de drogas e armas na fronteira de Mato Grosso do Sul com Paraguai e Bolívia, para executar agentes penitenciários federais em Campo Grande foi o estopim para o governo de São Paulo autorizar em conjunto com o Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco) paulista a transferência de líderes da quadrilha para unidades de responsabilidade da União, fato que acabou consumado em 13 de fevereiro e que fora revelado pelo Correio do Estado em janeiro.

Assim que a atual cúpula do Ministério da Justiça, de responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro (PSL), assumiu neste ano, a Polícia Federal revelou planos interceptados por sua inteligência de que pelo menos dois assassinatos de agentes federais em 2017 aconteceram como represália decidida pela cúpula do PCC e seu principal líder, Marcos Willians Herbas Camacho, 51 anos, atualmente cumprindo pena em Brasília (DF).

Segundo o portal ‘UOL’, a ordem fora dada muito antes, mais precisamente em 2014, quando o PCC decidiu “intimidar e desestabilizar os funcionários do sistema penitenciário federal.”

O plano era complexo e ousado: matar pelo menos dois agentes para cada uma das unidades penais federais que existiam na época: Catanduvas (PR), Mossoró (RN), Porto Velho (RO) e a da Capital.

Marcola, principal líder do PCC, agora transferido para o Presídio Federal de Brasília desde o dia 22 de marçoMarcola, principal líder do PCC, agora transferido para o Presídio Federal de Brasília desde o dia 22 de março

“Não bastaria ser servidores de cargos burócráticos, mas sim da diretoria ou com contato com os presos. Os crimes aconteceriam longe da penitenciária, de preferência na própria casa da vítima, na frente da família”, revela relatório do Ministério Público Federal de Rondônia.

“Desde 2014 já havia uma movimentação junto à cúpula do PCC, com a emissão de um ‘salve’ (como são chamada as ordens dos líderes), no sentido de planejar ações que demonstrassem o descontentamento da facção com o que eles chamam de ‘opressão’. Opressão seria o tratamento rígido, dentro dos parâmetros legais que eram impostos aos membros da organização”, completa o texto do MPF.

SUCESSO NA MISSÃO

Se execuções não foram registradas em Campo Grande, em outras cidades com presídios federais elas aconteceram. E desencandearam as investigações.

Henry Charle, assassinado pela facção em abril de 2017Henry Charle, assassinado pela facção em abril de 2017

A primeira delas foi a de Henry Charle Gama e Silva, 50 anos, em 12 de abril de 2017. Por volta das 16h daquele dia, ele estava sentado em um bar perto de sua casa em Mossoró (RN) quando pelo menos dois homens desceram de um Fiesta branco atirando em sua direção. Mesmo atingido, a vítima tentou correr para se salvar. Foi alcançada e executada a sangue frio com um tiro na cabeça.

mais de um mês depois, em 25 de maio, a vítima foi a psicológa Melissa Almeida, 37 anos, morta a tiros em Cascavel (PR) e que trabalha no presídio federal da cidade vizinha de Catanduvas.

Naquele dia, ela sofreu emboscada quando chegou em casa de carro com a família, o marido, um policial civil, e o filho de 10 meses. O policial tentou revidar o ataque e acabou baleado. A criança saiu ilesa.

Mais de 20 pessoas foram identificadas como autores dos dois crimes. E todos eles apontaram um mesmo nome como o mandante: Roberto Soriano, conhecido como ‘Betinho Tiriça’, 44 anos.

‘Tiriça’ é um dos principais líderes do PCC, acusado de mais de 12 homicídios em toda a região metropolitana de São Paulo (SP) e em 16 de novembro de 2012 se tornou o primeiro integrante da facção a ser transferido pelo governo paulista parea um presídio federal após ser flagrado em escutas ordenando a morte de policiais militares daquele estado.

Melissa Almeida, morta na frente do filho de 10 mesesMelissa Almeida, morta na frente do filho de 10 meses

No sistema federal, ‘Tiriça’ continuou com o mesmo modo de atuação. “Se me tratar bem, eu trabo bem. Se me tratarem mal, eu trato mal”, disse a um agente em Cataduvas no dia 14 de março de 2017.

Acusado de ter cometido mais de 15 faltas disciplinares graves, ‘Tiriça’ passa o maior tempo no cárcere isolado no Regime Disciplinar Diferenciado, sem direitos como visitas e banho de sol. Atualmente está em Porto Velho e ficará nessa condição até 30 de novembro deste ano após ser condenado cinco vezes pela indisciplina.

EFEITO DOMINÓ

A experiência com ‘Tiriça’ levou os presídios federais a reforçarem sua segurança diária. E a mudarem métodos de atuação internos das unidades prisionais. O que voltou a desagradar lideranças do PCC que caíram no sistema federal a partir de 2018. E, desta forma, resgatar os planos antigos do líder isolado de amendontrar os agentes com ameaças de assassinatos. Mas desta vez esses ‘salves’ saíram de São Paulo e não das unidades federais.

Primeiro integrante do PCC a ser transferido para um presídio federal, 'Tiriça' está em regime diferenciado até novembro de 2019: plano de execução de agentes foi criação delePrimeiro integrante do PCC a ser transferido para um presídio federal, ‘Tiriça’ está em regime diferenciado até novembro de 2019: plano de execução de agentes foi criação dele

oi a deixa para a nova gestão estadual em São Paulo, de João Dória (PSDB), que com conversas interceptadas pela Rota (tropa de elite da PM paulista) e o Gaeco-SP evitaram um desdobramento das ameaças. E serviram de impulsão para a transferência de toda a cúpula do PCC para o sistema federal, onde não teriam como ter contato com integrantes soltos para concretizarem os planos.

Desde o final do ano passado o juiz Paulo Eduardo Sorci, da 5ª Vara das Execuções Criminais de São Paulo, autorizou a transferência líderes do PCC acusados de integrar a cúpula da organização criminosa e emitir ordens para execução de crimes de dentro de presídios de segurança máxima paulistas. O pedido foi feito pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, sob o argumento que é preciso isolar o grupo para que eles deixem de emitir ordens ao restante da quadrilha.

Os presos transferidos atuavam como “sintonia de estados e até países” da organização criminosa.

Recentemente, a Polícia Civil de Mato Grosso do Sul desencandeou um plano de execução de agentes de segurança do Estado muito semelhante ao adotado a nível federal pela quadrilha. Cinco integrantes do chamado ‘Esquadrão da Morte do PCC’ no Estado foram presos.